Natal no Brasil: Depois de 10 anos, um estranho no ninho.
Uma das
coisas que todo expatriado sofre, inevitavelmente, ainda que não seja daquelas
pessoas super ligadas às tradições, é passar datas comemorativas importantes
longe da família. Eu chorei muito no meu 1º Natal longe de casa e por todos os
anos senti aquele aperto no coração de ser a cadeira vazia na casa da minha mãe,
a que falta na tradicional foto familiar.
Esse foi meu 10º Natal vivendo fora, e pela 1º vez pudemos ir ao Brasil nessa época do ano. Foi uma viagem
muito planejada, afinal de contas era o 1º Natal que pudemos ir com a família
completa, já que meu marido nunca coincidiu férias com nossas idas ao Brasil. Ou seja, tinha tudo para
ser perfeito. Só que na vida real NADA é perfeito, a vida é feita de uma sucessão
de momentos, bons e ruins, e tudo isso junto misturado é o que dá o tempero na
vida, não tem nenhum problema com isso, exceto se criarmos muita expectativa, e
euzinha aqui sou muito pragmática para cair nessa armadilha, rs...mas o mesmo não
posso dizer dos filhotinhos... por mais que a gente tentasse explicar que as
coisas serão meio corridas, eles não tem como entender que estarão totalmente
fora do seu ambiente e que isso pode ser mais estressante que divertido.
Tenho
invejinha de algumas amigas que tem a família inteira no mesmo bairro, ficam na
casa da mãe e conseguem ver todos, sem muito malabarismo, mas não é o meu caso.
Minha família está dividida em 3 Estados e as famílias, minha e do meu marido não
tem nenhuma convivência e bem pouca coisa em comum, assim que minha trajetória na
terrinha é sempre levando malas de um lado para outro, percorrendo muitos quilômetros
com carro alugado ou UBER, muitas malas e equilibrando humores de crianças sem
wi-fi ou amiguinhos e com o clima jogando contra toda a viagem.
Minha
melhor amiga é sempre a primeira a me roubar no aeroporto, é minha 3º irma e me levou direto para casa da minha mãe, voltar para seu quarto de
solteira, ter espaço no guarda roupa, é uma delícia. A gente relaxa, volta no tempo, e mesmo que os filhos cobrem,
lembramos no nosso antigo eu, de outro tempo, outra vida. E como minha mãe é
quem sempre vem para o México, é a única família que as crianças conhecem de
verdade, convivem, como família real, com tudo de bom e ruim, como qualquer familia normal, eu fico tranquila de ver meus amigos, sair para passear, ficar de pijama
o dia todo, comer o que dá na telha. Eu
abro minha agenda meses antes de ir viajar, dessa vez algumas amigas
conseguiram tirar um dia de folga no trabalho para eu poder passar o dia
todinho com elas, e gente, não dá, uma tarde, um dia, uma noite é muito pouco
para colocar anos em dia. É bom demais, mas dura tão pouco, que eu digo, para
curtir de verdade só quando consigo receber alguma delas aqui no México, que
podemos dedicar dias inteiros para relembrar, fofocar, criar novas recordações.
Fica sempre aquele gostinho de quero mais, aquela vontade de vale a pena ver de
novo, mas temos uma agenda e novos velhos amigos para ver, e queremos estar com
todos, e nessa época do ano é meio impossivel conciliar.
Como não podia
deixar de ser, a semana passou voando e no fim de semana seguinte voamos para
Curitiba, naquela correria de fim de ano em aeroporto, deslocamos malas, vó, crianças
e fomos para a casa da minha irmã curtir minha sobrinha pequena, e ver os primos que consegui ver. Entre muita comilança em Santa
Felicidade, reencontro de família, terminamos o dia exaustos e com mais sensação de que os dias deveriam
ter 72h, e claro
faltam dias e recursos para ver os outros tios e primos que amamos e vivem em
lugares distantes.
Por ironia
o único dia de sol foi em Curitiba que sempre tem clima ruim, no domingo quando
pegamos maridão e minha outra irmã no aeroporto para pegar a estrada para SC e
ver meus avós já foi virando o tempo, e a semana na praia foi aquele mico de
chuva e frio. Para mim sinceramente, estar com meus avós octogenários é um privilégio que tenho muita consciência
de que sempre pode ser a última vez. Infelizmente é difícil segurar a barra de
2 crianças sem tv a cabo, internet, outras crianças, ainda mais sabendo que tem
praia ao lado. Até deu para dar uma escapada nos 2 primeiros dias, mas a chuva,
vento e frio nos fizeram desistir. Apesar do tempo, falta de audição, o amor e
carinho de conviver com meus avós esses dias são tesouros que guardo no coração,
GRATA por ter tido mais uma vez a chance de ter avós, mae, todas minhas irmas, sobrinha e minha familia sob o mesmo teto, de provar o doce de abobora da vó e a
pipoca do vô, abraçar, beijar, tirar fotos e criar novas memórias, mesmo que
uma delas seja as carinhas enrugadas chorando e acenando dando tchau pelo
retrovisor. Não tem palavras para explicar a mistura de amor e tristeza de cada
adeus aos meus velhinhos.
Já de volta
a SP, mais um dia para ver os últimos amigos antes do Natal e foi hora de
deixar o maridão curtir a família, mais uma odisseia de malas dividindo tempo
com cunhadas, sogra e sobrinhos, de repente chegou o Natal. Dia 24, ceia farta,
arvore cheia de presentes, oração com a família, tradicoes cumpridas, presentes abertos, papo vai, papo vem e a noite
acaba as 5 da manhã...mas no dia seguinte ainda é Natal da casa da outra avó,
que decorou cada ambiente da casa para o Natal, com um amor sem limites de ter
seus netos juntos pela primeira vez em um Natal em casa, fez o almoço natalino
cheio de amor e sabor. Meio zumbi, cansados, mas desejosos de desfrutar
novamente cada momento, vivemos o dia 25 em família, com todo carinho,
presentes e o sabor agridoce de que o tempo dedicado para o meu lado já estava
terminando.
Passei os últimos dias antes do ano novo entre correria de colocar em
dia vacinas, resolver problemas com banco, ir atrás de documentação e convivendo
com a família do maridão, conseguimos ver mais alguns amigos no caminho, mas
como minha sogra já tem a saúde debilitada, a prioridade era poder vê-la
diariamente, pois novamente sabemos que estar com ela e com o padrasto do meu
marido de 92 anos é parte do mesmo privilegio de estar com meus avós, saber que
nossos velhinhos tem pouco tempo e não saber se teremos novamente oportunidade
de vê-los, é de longe a coisa mais dolorosa de viver longe. Passamos outra ceia deliciosa de Ano Novo, cercados de muito carinho e na manha seguinte, novamente zumbis, lotamos 2 carros e voltamos ao Mexico.
No fim das
contas nos damos conta de que a tecnologia não substitui mesmo o convívio, o
almoço de domingo, e que infelizmente, para meus filhos, essas são as raízes de
seus pais, não a deles. Claro que sentem e percebem todo o amor envolvido, com as
bisavós, avós, primos, tias, amigos, mas se sentem estranhos no ninho. O vocabulário,
as brincadeiras, musicas, tudo é diferente. Me orgulho tanto de que meus filhos
falam português apesar de terem passado toda a vida fora do Brasil, tento
passar minha herança cultural, mas a realidade é que, meu mundo de experiências
no Brasil congelou a 10 anos atrás. Tudo vai mudando nesse mundo acelerado e
uma década é uma nova geração de valores e cultura, que eu mesma não faço mais
parte.
Pela primeira vez me senti uma estranha no meu país, já não reconheço os
mesmos valores, sabores, expressões artísticas, é meu país, tenho muitas recordações
na parede da memória, como fotos amareladas pelo tempo, mas já não reconheço o
novo. Meu lar está do outro lado do continente. Amo demais a familia e amigos que deixei
para trás, e depois de tanto tempo é impressionante que o amor, carinho e importância
deles na minha vida se mantenha intacto, mas é triste não poder criar novas recordações
com eles, pelo tempo tão curto que temos em cada estadia esporádica.
Assim como
eu, eles vêm minhas fotos com novos amigos e sabem que estou bem. Vemos nossos
filhos crescendo distantes, e gostaríamos de ter tido a oportunidade de fazer
as coisas serem diferentes, do espaço e tempo poderem coexistir, mas nos
conformamos como as coisas são. Seguimos esperando as raras visitas, pois
sabemos que as coisas não estão fáceis na terrinha, e planejamos uma próxima ida, que sabemos que será corrida, como sempre.
Vida de expatriado é assim mesmo, metade aqui, metade ali. Por 10 anos, criamos e adaptamos um novo mundo para nós, somos
privilegiados quando temos amigos tão bacanas que nos fazem ter
saudades da nossa casa no México, mesmo vivendo o sonho de estar passando o Natal no Brasil, vivendo na pele, pela primeira vez, a utopia que eles veem
de lá, da grama verde perfeita, dos sorrisos congelados nas fotos familiares do
facebook.
Sigo tentando colocar o sono de tantas noites em claro em dia, mas precisamos férias das férias para descansar um pouco.
Feliz 2018 para todos, e lembrem-se que nao existe mundo perfeito, momento ideal, devemos ser feliz com o que podemos ter aqui e agora, nosso lar é onde está nosso coracao.
Fabiana Giannotti, brasileira radicada no México desde 2008.. Blogueira, Escritora, Fotografa, Assessora a expatriados. Me considero afortunada por viver no México, aprender a respeitar e conhecer essa bela cultura. Conhecer, adaptar-se, aprender, mudar, acostumar, respeitar, amar o diferente são algumas coisas que descobri nos últimos anos, além do fato que, por mais perfeito que seja o plano tudo pode mudar de repente...
E-book, livro digital – Venda direta: fabiana.giannotti@yahoo.com.br
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2 comentários
Nossa! Emocionada!
ResponderExcluirE depois desse, e de tantos outros, post sincero, eu penso com mais cautela sobre morar em outro país. Se eu consigo ou não lidar com essa distância da minha família.
Muito bom o seu texto.
a distancia é dificil, tem seus pros e contras, mas tem que ter muito claro que algumas coisas nao tem como, tem que viver sem.
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